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Navegar é preciso. Viver não é preciso.”

Navegar é preciso. Viver não é preciso.”

Navegar é preciso. Viver não é preciso.

Eu adoro Fernando Pessoa. Ele escrevia com alma e uma profunda conexão com as palavras. O poema sobre navegar e viver é de uma genialidade impressionante. Há dois significados que ele se refere utilizando essa frase do General romano Pompeu (106-48 aC) que ficou famosa quando ele a proferiu para motivar os marinheiros amedrontados a irem para a Guerra (cf. Plutarco, in Vida de Pompeu).


De imediato, interpretamos que ele se refere ao fato de que navegar é mais importante que viver. Para os marinheiros, de uma forma geral, navegar é o que dá sentido a suas vidas. Ou seja, é necessário que o viver envolva um sentido. Para Pessoa, enfatizado no próprio poema, o sentido precípuo de sua vida era criar. O outro significado expressa subliminarmente a questão de que a navegação envolve instrumentos precisos. E na vida não há a mesma precisão. Lidamos continuamente com imprevistos e surpresas.


Na semana passada contei um pouco do meu drama atual em relação ao adoecimento do meu pai. Essa semana tudo mudou. Consegui encontrar uma médica maravilhosa, neurologista, que nos fez uma consulta domiciliar. Foram quase duas horas de avaliações. Ao final, ela disse: “creio que consigo fechar um diagnóstico para o que ele tem: Parksonismo”. Não é o mal de Parkinson, é uma outra síndrome dentro dessa categoria maior. Ela prescreveu uma medicação. Hoje é o quinto dia de tratamento e ele já fala melhor e consegue dar alguns passos. Fiquei radiante como conseguimos evoluir rápido após a precisão do diagnóstico. Instrumentos precisos, portanto, são absolutamente úteis, pois nos indica um caminho a seguir. Entretanto, no fim das contas, a resolução do problema geralmente envolve um mosaico de ações: luta diária, mudança comportamental e muito investimento na adesão ao tratamento.


Na semana passada, eu lidava com uma contingência desanimadora. Entro essa semana com outra perspectiva. Muito mais otimista. E é exatamente essa reflexão que deixo a vocês no meio de todo esse contexto desolador que vivemos com essa pandemia. Não há como precisarmos ou prevermos quando tudo isso irá acabar. A certeza é somente na transitoriedade da vida e de seus eventos. Isso vai passar. Dias melhores e de mais esperança virão. O que pode nos auxiliar no enfrentamento disso tudo é encontrarmos um sentido para a nossa luta. Estou certa que tivemos e temos muitos aprendizados diários durante todo esse período. Melhor nos atermos a eles.

Dêem uma olhada no poema integral de Pessoa:

 http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/jp000001.pdf


Reflexões Psicoterapêuticas

Por Laura Torquato 14 de janeiro de 2022
Os pais representam grandes modelos em nossas vidas. Não há processo psicoterapêutico que não envolva discorrer sobre nossas origens. E pais exercem um papel fundamental: são as nossas primeiras e mais profundas experiências de vínculos. Se pensarmos bem, vínculo está diretamente relacionado à sobrevivência. Não sobrevivemos sem alguém que nos forneça cuidados e proteção. E como eu gosto de tocar nesse assunto em terapia... Há um livro que eu adoro e sempre recomendo aos pacientes que se chama “Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes”, de Stephen Covey. Ao final do livro há uma passagem em que o autor discute a importância dos pais dele. Ele menciona que muitas vezes cobrou que seus pais não errassem. Como assim? Todos erramos. Isso é democrático. Todos atravessamos enormes dramas e processos emocionais. Por que será que tendemos a julgar tanto os nossos pais? Importante compreendermos que a despeito dos erros (que foram certamente importantes também), nossos pais nos ofertaram o melhor que puderam. Meu pai atualmente está passando por um processo muito difícil de adoecimento. Desde março desse ano (coincidentemente com o início da pandemia por aqui) ele vem sofrendo com um quadro neurológico complexo. Não há diagnóstico até então. E ele vem perdendo bastante de sua autonomia e de seu controle motor. Hoje ele tem 85 anos de idade. É uma pessoa maravilhosa e tem uma história interessantíssima. Foi padre por um bom período de sua vida e casou aos 40 anos de idade, no meio da década de 70, rompendo com as barreiras da Igreja Católica. Sempre lembro de seus comentários sobre a família ser o maior tesouro que teve. Passar por essa experiência com o meu pai me faz contactar muitas histórias de perdas e adoecimentos que acompanhei com pacientes ao longo de quase vinte anos de consultório. Não é nada fácil. Atravessamos mares de fragilidades, de choros constantes, de muita carga emocional. Mas fato é que não há como não pensarmos nesse continuum de vida. Estar com 85 anos de idade envolve adentrar uma etapa final, em que geralmente muitas limitações tornam-se uma constante. Percebo que nossa cultura não gosta muito de falar sobre o envelhecer e que infelizmente, de uma forma geral, não valorizamos nossos velhos. Esses que fizeram e fazem tanto por todos nós. Quanta doação e quanto amor está envolvido no papel de ser pai e mãe. O processo de gestar uma criança, cuidar desde o nascimento, perpassar todas as fases de desenvolvimento faz com que os pais direcionem muito de sua vida a isso. É um trabalhoso e gratificante projeto de vida. Certa vez li uma frase linda que dizia que a sua maior contribuição ao mundo não é necessariamente o que você faz, mas quem você cria. E esses últimos dias tenho pensado em como sou grata por ter um pai tão bacana em minha vida. Um pai que apesar de trabalhar de manhã, de tarde e de noite durante a minha infância e adolescência, sempre foi um pai extremamente presente, que brincava conosco, ria grande parte do tempo e era um homem de muita fé. Eu sempre tive meu pai como uma grande fortaleza, um grande porto seguro e vê-lo assim tão limitado não abala essas minhas memórias tão ricas de contato, mas só me faz compreender e aceitar a transitoriedade da vida. E eu apenas consigo pensar agora como eu quero estar forte nesse papel de cuidar, fornecer conforto, serenidade e de tentar ter um pouco dessa fortaleza e fé que o caracterizam tanto.  Que tal refletir sobre a importância de seus pais em sua vida?
Por Laura Torquato 14 de janeiro de 2022
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